Era uma vida como todas as vidas.
Ou não seria uma vida como todas as vidas?
Nem todas possuem a tranquilidade das árvores.
Não!
Era uma vida única. A serenidade habitava no seu semblante. Todos os seus gestos eram harmoniosos.
Caminhava como se flutuasse. A sua voz, afectuosa. O seu olhar, melífluo. E a sua sabedoria, infinita. Vivia numa cabana de madeira, construída no meio de uma pequena floresta, não muito afastada da povoação.
Ela procurava-o frequentemente. A tranquilidade daquela vida apaziguava os demónios que a atormentavam. Sempre foi recebida no pequeno jardim, que rodeava a cabana. Nunca ninguém ousou invadir a intimidade daquele lugar. Sentavam-se, cá fora, nuns bancos de pedra, e era debaixo da folhagem de um belo carvalho que ela sorvia as suas palavras sábias, com a avidez dos sequiosos. Quando chovia, ficavam debaixo do telheiro, sentados em cadeiras de verga, a olhar a chuva, num silêncio que tudo dizia.
Ninguém sabia o nome dele. Era conhecido simplesmente como o
Velho Sábio da Floresta. Barbas e cabelos brancos e longos, ondulavam ao sabor do sopro do vento. Vestia longas túnicas, à moda dos velhos orientais. Numa das mãos trazia sempre uma pequena pedra, em forma de coração, de uma brancura transparente. Era a pedra da Sabedoria.
Se a apertares com força, entre as tuas mãos, sentirás a sua energia benéfica. Dizia-lhe. E ela acreditava.
Um dia procurou-o, por se sentir perdida. Disse-lhe:
Lanço à terra sementes que nunca florescem. Porquê? – Referia-se às iniciativas que tomava para mudar o rumo à sua vida.
–
Na verdade, nem sempre os lírios florescem (1)...
Vai, medita nestas palavras, e regressa apenas quando tiveres compreendido o significado delas… – Disse-lhe, então, o velho sábio.
Naquele dia, ela deixou-o, desassossegada. Nem sempre os lírios florescem… Que significado teriam aquelas palavras?
De regresso a casa, teve de atravessar um campo. Nesse campo, entre muitas outras pequenas flores, havia lírios silvestres. Contemplou-os longamente. Os lírios…Veio-lhe à lembrança o que disse Mateus:
Olhai os lírios dos campos, não trabalham, nem fiam; e vede como crescem; nem mesmo Salomão, com toda a sua glória, se vestiu como um deles.
Fez-se então uma luz dentro dela.
Não sabia se havia compreendido o verdadeiro sentido das palavras do velho sábio, mas decidiu regressar à floresta, nesse mesmo dia, e disse-lhe:
Velho, acabo de aprender com os lírios do campo que rodeia este lugar que nem sempre é possível cultivar um sonho…
O velho sábio apertou as mãos dela nas dele, e sorriu…
(1) Nec semper lilia florent – Nem sempre as coisas correm à nossa maneira (locução latina).
in «
OS DIAS DE JOSÉ... e Outras Narrativas», © Josefina Maller (a aguardar publicação)
(Origem da imagem: Internet)
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