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quinta-feira, 13 de outubro de 2011

SOLIDÃO


Aproximo-me da noite
o silêncio abre os seus panos escuros
e as coisas escorrem
por óleo frio e espesso

Esta deveria ser a hora
em que me recolheria
como um poente
no bater do teu peito
mas a solidão
entra pelos meus vidros
e nas suas enlutadas mãos
solto o meu delírio

É então que surges
com teus passos de menina
os teus sonhos arrumados
como duas tranças nas tuas costas
guiando-me por corredores infinitos
e regressando aos espelhos
onde a vida te encarou

Mas os ruídos da noite
trazem a sua esponja silenciosa
e sem luz e sem tinta
o meu sonho resigna

Longe
os homens afundam-se
com o caju que fermenta
e a onda da madrugada
demora-se de encontro
às rochas do tempo



Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas"

terça-feira, 20 de abril de 2010

SÚPLICA...



Eis-me prostrada sobre a terra,

ainda húmida do orvalho da noite.

Sinto-lhe o cheiro forte e doce,

este cheiro que me conduz

a um tempo que desconheço,

a lugares nunca visitados,

a experiências nunca vividas,

a memórias imemoráveis,

a um sino que toca na escuridão,

a pedras soltas,

ruínas,

heras cobrindo muros...

Não sei onde estou,

não sei o que sou,

não sei...

O que queres de mim, terra,

que me chamas com o teu odor, forte e doce...?

Por que me arrastas

para estas desconhecidas lonjuras? ...

Deixa-me voltar

para o meu universo

feito de silêncios e sons,

de luas e sóis,

e desta flor que

desabrocha todas as manhãs,

no meu olhar...