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sábado, 30 de janeiro de 2010

SOU NUVEM QUE PASSA...



A noite veio


envolta em sonho,

e eu sonhei...

...

Amanhece agora

e eu vou embora

não mais voltarei.

Porque

sou ar

sou vento

sou nuvem

que passa

ligeira,

não posso ficar...

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

DORIS MAUSER: O PODER DA ARTE




Doris Mauser nasceu em Heilbronn (Alemanha).

Aos 13 anos soube que tinha esclerose múltipla, o que progressivamente a deixou imobilizada e a atirou para uma cadeira de rodas.

Contudo, Doris Mauser não esmoreceu. Dentro de si a semente da arte floresceu, e mesmo incapacitada, conseguiu criar: pinta com a boca, e as suas aguarelas são extraordinariamente belas.

Desse modo, Doris Mauser transmite-nos uma paz que vem de um íntimo belo e que não se deixou abater pela doença.


Entre as suas obras, destaco esta pequena aguarela que aqui reproduzo Galatea e Triton, porque vem ao encontro do que pretendo transmitir neste espaço, onde solto as palavras e deixo que sigam os ventos...

Galatea, significa “branca como o leite”, e é uma ninfa dos mares: Triton (Tritão) é um deus marinho, filho de Poseídon, mas também é a maior lua do planeta Neptuno.

E este encontro entre ambos é a pequena história de algo grande: a arte de Doris Mauser, que utilizo para desvendar abismos...

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O GATO ROMÂNTICO



          O gato

          namora

          a lua.

         Coitado!

         Como alcançá-la?



               É esse o

               seu grande drama!...


domingo, 24 de janeiro de 2010

SABEDORIA DE UM VELHO ÍNDIO

Um velho índio descreveu certa vez os seus conflitos internos:

«Dentro de mim existem dois cães, um deles é cruel e mau, o outro é muito bom e dócil. Eles estão sempre a lutar».

Quando então lhe perguntaram qual dos dois cães ganharia o combate, o sábio índio parou, reflectiu e respondeu:

«Aquele que eu alimentar».




sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

ANIMISMO...






Para que a vida não fosse um mero rolar dos tempos, o Criador dotou todos os seus seres de entendimento, compreensão e sensibilidade. Em suma, de um ânimo essencial para o fluir da vida. A cada criatura foi igualmente concedida uma linguagem inerente à natureza do seu próprio ser.

Todos os animais e plantas compreendiam-se mutuamente, através de linguagens secretas, e, por vezes, no caso das pedras, o silêncio bastava. Nada havia sido criado sem sentido. Em tudo havia uma harmonia afectuosa e infinita.

O Sol foi criado com a finalidade de aquecer a Terra e afastar as trevas do mundo, para que, desse modo, todos os seres vivos pudessem saborear, com lucidez, a sua própria existência. A Lua e as estrelas cobriram o espaço com um manto de penumbra tépida, para que o descanso dos seres fosse mais terno.

A água seria a fonte da vida.

Os animais, através das suas vozes, e as plantas, com o murmúrio subtil da sua folhagem, quebrariam o silêncio do mundo e dar-lhe-iam movimento.

Rajid relinchava ternamente, como que agradecendo o privilégio de ter sido moldado pelas próprias mãos do Criador.

A vida fervilhava em todos os recantos da Terra. Toda a Natureza havia sido animada pela voz de Deus, e o planeta, recém-criado, rejubilava.

No espaço, ecoava um cântico de infinitas e enigmáticas vozes, que o Criador escutava deleitado. Era uma ode amorosa à sua obra, entoada por todas as criaturas viventes.

Rajid não era rei nem vassalo. Era um príncipe. O príncipe da Terra. Não dominava, apenas coexistia pacificamente com os outros seres das montanhas, dos vales, das planícies, dos bosques, dos mares e dos rios. Ele constituía o equilíbrio do paraíso que Deus criara para todos esses seres.

Somente as pedras permaneciam silenciosas. Eram elas o sustentáculo do mundo. De olhar mudo e vigilante, guardavam os mais profundos e indizíveis segredos da criação divina.

in «História de um Cavalo Selvagem» © Josefina Maller (a aguardar publicação)

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

EU GOSTO DAS ALDEIAS SOSSEGADAS...




Eu gosto das aldeias sossegadas

com seu aspecto calmo e pastoril,
erguidas nas colinas azuladas,
mais frescas que as manhãs finas de Abril.

Pelas tardes das eiras, como eu gosto
de sentir a sua vida activa e sã!
Vê-las na luz dolente do sol-posto,
e nas suaves tintas da manhã!…

As crianças do campo, ao amoroso
calor do dia, folgam seminuas,
e exala-se um sabor misterioso
da agreste solidão das suas ruas.

Alegram as paisagens as crianças
mais cheias de murmúrios de que um ninho;
e elevam-nos às coisas simples, mansas,
ao fundo, as brancas velas de um moinho.

Pelas noites de Estio, ouvem-se os ralos
zunirem suas notas sibilantes…
E mistura-se o uivar dos cães distantes
com o cântico metálico dos galos.

Gomes Leal, in Claridades do Sul


segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

RAJID...

Rajid era um cavalo selvagem. A mais bela e perfeita entre todas as criaturas que viveram nos bosques virgens, no início dos tempos.

Esta é a sua história. Uma história que nos fala do equilíbrio que existia na Natureza, na sua forma mais pura, e como ele, Rajid, um ser selvagem mas sensível, ajudou a manter esse equilíbrio até ao dia em que toda a harmonia – a própria essência da vida dos primeiros tempos – se perdeu com a chegada do homem, que fez emudecer a Natureza.

Apenas Rajid continuou eternamente selvagem, embora prisioneiro da sua própria liberdade, num mundo confinado com um vale profundo e inacessível, envolto em névoas perpétuas. Um pedacinho de mundo que Rajid conquistou ao homem e fez somente seu.


No início dos tempos nada existia. Era o vácuo.
          


Desejando Deus emergir das trevas e do silêncio que o rodeavam, criou a luminescência, e sob essa claridade fez brotar a vida e deu infinitas formas à sua ilimitada imaginação.
Foi então que do negro espaço celeste nasceu uma esfera de fogo, outra de prata e uma infinidade de esferas menores, tão luminosas e brilhantes como o mais puro dos diamantes. À primeira esfera o criador deu o nome de Sol, à segunda chamou Lua, e às restantes, estrelas.
O Sol reinaria de dia. A Lua e as estrelas brilhariam no escuro da noite.
E o universo iluminou-se, ora de uma luz irradiante, ora de uma luz delicada.
Aos olhos de Deus, porém, o que acabara de criar era demasiado insignificante, e decidiu então espalhar pelo espaço, astros, planetas, cometas, vias lácteas e outros sistemas solares. E o universo povoou-se de pequenas e grandes esferas. Umas mais cintilantes do que outras, mas todas misteriosas e belas. Contudo, pensou Deus, de que adiantava ter criado todo aquele imensurável universo se nele não palpitava a vida? Foi então que, num rasgo de criação, Deus escolheu um planeta entre os planetas – a Terra – e nele fez jorrar infinitas nascentes de água.

E a água foi a fonte da vida.

Sobre a Terra irromperam oceanos, rios, lagos, fontes, riachos e pântanos, e para que o planeta não ficasse todo coberto de água, Deus fez erguer montanhas para suster as correntes, e espalhou belas planícies e vales por toda aquela natureza que nascia.
Lentamente, a imaginação do Criador foi tomando mil e uma outras formas. Da terra brotaram ervas, flores e árvores com sementes para que se multiplicassem e não mais deixassem de crescer. E assim surgiram os prados verdes. Os jardins floriram. Os bosques e as florestas povoaram-se de folhagem viçosa. E o planeta encheu-se de beleza.
O silêncio, todavia, continuava profundo e perturbador. Foi então que a uma ordem de Deus uma leve brisa começou a soprar, fazendo correr as águas e sussurrar as flores e as ervas e a ramagem das árvores. E assim nasceram também as ondas do mar. E os prados, jardins e florestas encheram-se de uma melodia afectuosa, quase imperceptível, que transformou o silêncio num delicado murmúrio.
A obra de Deus, contudo, estava ainda incompleta.

Faltavam-lhe algumas criaturas. Deus ordenou, então, que as águas produzissem seres vivos. Que pássaros cruzassem o espaço. Que répteis rastejassem na terra, e que pequenos e grandes mamíferos proliferassem por todo o planeta.
E nos mares, rios e lagos surgiram peixes de várias cores e tamanhos. O espaço povoou-se de pequenos e grandes pássaros, e a Terra encheu-se de animais de muitas espécies.

Todos os lugares foram orvalhados com vida: as águas, a terra e o espaço. Já não havia trevas, nem silêncio. O mundo inundou-se de cânticos e de luz, mas faltava ainda a cor. Então, uma vez mais, o Criador, numa pincelada de mestre, encheu a sua criação das mais variadas tonalidades: o céu seria de um azul que se reflectiria nas águas; a folhagem deveria ser inevitavelmente verde, e para as flores todas as cores.
E aos cânticos e à luz juntou-se agora uma infinidade de tons, que encheram a Natureza de um impressionante colorido. E a Natureza, porque abrigava em si, todas as sementes, seria a Grande Mãe de todos os seres animados e inanimados, que daí em diante passariam a coexistir pacificamente.
Na última madrugada, aquela em que encerraria o acto da criação, Deus subiu à mais alta das montanhas e contemplou a sua obra, no entanto, ainda inacabada. Faltava-lhe criar um ser que, pela sua beleza, inteligência e conhecimento dos segredos do Universo, sublimasse aquele paraíso, acabado de nascer.
Foi então que, a um sopro de Deus, uma silhueta negra, tão negra como as trevas que existiam no início dos tempos, começou a desenhar-se entre o verde da planície.

Era Rajid – o cavalo selvagem – que nascia, como um raio de aurora, no jardim imperecível de Deus...

* Pintura de Argina Seixas

in «História de um Cavalo Selvagem» © Josefina Maller (a aguardar publicação)


sábado, 16 de janeiro de 2010

AS HISTÓRIAS MALUCAS DE TÓZEZINHO DE ALENCAR

Chamam malucas às minhas histórias. Mas deixem falar quem tem língua comprida. Eu cá não me ralo. Não vim criticar isto ou aquilo. Pediram-me apenas para contar histórias cá à minha maneira. E eu vou contar uma, e acreditem ou não acreditem, ela é verdadeira, pois passou-se bem à frente do meu nariz, lá para as bandas de onde eu moro, no Largo do Chafariz.
Esta é a história do cão mandrião, que passava o dia a fingir que dormia, à beira da Loja do Salsicheiro.

Ai que trapaceiro!
Com um olho dormitava. Com o outro, ele espreitava. E o Salsicheiro, volta e meia, e meia volta, tropeçava no rabo do cão e este gania, gania até fazer doer o coração. E, com feitiço nos olhos, o cão olhava o Salsicheiro como quem diz:

— Sou tão infeliz! Pisaste-me o rabo, ó seu diabo! Hás-de ir pró inferno!

E o Salsicheiro, já nisto vezeiro, dizia furioso:

— Está bem, está bem, eu cá me governo! Mas pára com isso!
E o espertalhão do cão ganhava um chouriço.

E todos os dias, isto acontecia. E o Salsicheiro não se apercebia de que o cão mandrião este truque fazia, porque já sabia do seu fraco eterno: o medo que tinha de ir para o inferno.




E assim, todos os dias, de feitiço em feitiço, o espertalhão do cão mandrião ganhava um chouriço.




sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O QUE DISSE VOLTAIRE

É triste não ter amigos?


Ainda mais triste é não ter inimigos, porque quem não tem inimigos, é sinal de que não tem:

Nem talento que faça sombra,

Nem carácter que impressione,

Nem coragem para que o temam,

Nem honra contra a qual murmurem,

Nem bens que lhe cobicem,

Nem coisa alguma que invejem…




quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

ON A BLUE ROAD (I)

Deram-me o nome de Túlio, e devo ter cerca de 15 anos, disse-me Sebastião, o Velho. Velho e sábio. Foi ele quem me ensinou tudo o que sei. Ensinou-me, por exemplo, esta canção, em inglês, uma língua que não sei, mas ele sim, porque aprendeu com um branco das Europas, e a canção diz assim:

On a blue road
A blue bird sings a happy
Song of love.
Yellow flowers swing gently
Like dancers on clouds.
Suddenly, a red bird comes
Along, singing a song of war:
The yellow flowers fall down
Fulminated by red songs.
And the blue bird
Starts singing
A sad song of love!

Gosto muito desta melodia e também das palavras. Pedi a Sebastião que me abrisse o escuro, para que eu pudesse ver a cor dessas palavras. E ele abriu o escuro. E então vi a cor das palavras: «Numa estrada sombria, um pássaro azul canta uma alegre canção de amor. Flores amarelas balanceiam-se suavemente, como bailarinas nas nuvens. Subitamente, aproxima-se um pássaro vermelho, cantando uma canção de guerra: as flores amarelas tombam, fulminadas por canções vermelhas, e o pássaro azul começa a cantar uma triste canção de amor

Decorei estas palavras como se bebesse mel, e delas fiz o meu credo. Credo foi também uma coisa que me ensinou Sebastião. Disse-me ele: Túlio, todo o homem deve ter o seu credo, não importa qual, desde que esse credo lhe aqueça a alma. E eu perguntei-lhe: «E o que é a alma, Sebastião?» E ele disse: «A alma, meu filho, vive dentro dos teus olhos».

Eu gostei do que me ensinou Sebastião, por isso, naquele dia, adormeci pensando na alma que vive dentro dos meus olhos.

Não me lembro de ter sonhado, nessa noite.

«On a blue road» © Josefina Maller (a aguardar publicação)

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

PENSAMENTO DO DIA (Fernando Pessoa)

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo. E que posso evitar que ela vá à falência.

Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.

Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e tornar-se o autor da própria história. É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.

É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.

Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um “não”. É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta. Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo… 

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

QUEM SOU EU...









Cidadã do mundo, de Josefina Maller basta saber que nasceu num dia de Inverno, ao fim de uma tarde de Janeiro, numa Europa em plena efervescência.

A infância e a adolescência foram passadas entre dois continentes – Europa e América do Sul – pontuadas pelo romantismo e proezas de viagens a bordo de grandes navios, vivenciando peripécias exóticas, aqui e ali, o que nela desenvolveram um espírito aventureiro, desassossegado, insatisfeito…

Não criando raízes em lugar nenhum, pois nunca se fixou mais do que cinco anos seguidos nas cidades por onde vagueou, em todas elas foi cultivando amizades e curtas experiências de vida no mundo das artes.

Começou pela música. O seu sonho maior era o de ser maestrina, e, para tal, frequentou, durante um ano, as aulas de um maestro sul-americano. Porém, o sonho foi interrompido por uma viagem e, circunstâncias várias, obrigaram-na a renunciar a ele. Optou depois, pelo ballet clássico, sendo uma “bailarina” do género funny girl, devido ao seu desajeitado jeito para a expressão corporal. Durou pouco, esta fantasia, e acabou por esquecer definitivamente a dança.

Mais adiante, embora já cultivasse o gosto pela escrita, tendo começado, aos quinze anos, a escrever short stories, em Língua Inglesa, para o jornal de parede da Escola que frequentava, não foi alheia a outras artes. Havia a música, e foi então que fez uma curtíssima carreira de pianista, como entertainer, a bordo de um dos navios em que viajou, ao lado de um pianista argentino, especialista em tangos. E, temporariamente, esqueceu a escrita.

Algum tempo mais tarde, insatisfeita com estas actividades, entrou para uma Escola de Artes Plásticas, onde se dedicou ao Abstracto: a arte do tudo, a arte do nada. O gosto pelo traço nunca a abandonaria.

Entretanto, ia a era hippie quase no fim, regressa à música, e decide aprender a tocar guitarra clássica, apenas para acompanhar a sua própria voz, nas baladas da moda, e, enfeitando-se de flores, adoptou a filosofia de vida “peace and love”, baseada numa liberdade sem drogas, sem libertinagem, e começou a cantar na rua, apenas por gosto (nunca por dinheiro), em festas particulares e num bar selecto, frequentado apenas por estudantes e professores universitários. Concluído o curso universitário, acabou-se igualmente a breve carreira de cantora hippie.

Depois, veio a realidade: o trabalho numa escola pública, durante dois anos. Não satisfeita, com horários e campainhas, enveredou novamente pela escrita, desta vez, jornalística, e pela arte fotográfica. Alguns anos durou essa carreira, de escrita e de fotógrafa, como freelancer, em vários jornais. Recebeu alguns prémios. Mas o seu maior prémio foi o de ter conseguido apanhar a vida em andamento…

Entretanto, o passado passou, e actualmente… bem, actualmente continua a escrever porque essa, enfim, é a sua verdadeira vocação.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

TEMPESTADE

No silêncio
a noite
chora
e chove
lágrimas
e suspira
dores
e grita
ventanias.
As estrelas
estremecem
e
com medo
a Lua
apaga-se...