Chamam malucas às minhas histórias. Mas deixem falar quem tem língua comprida. Eu cá não me ralo. Não vim criticar isto ou aquilo. Pediram-me apenas para contar histórias cá à minha maneira. E eu vou contar uma, e acreditem ou não acreditem, ela é verdadeira, pois passou-se bem à frente do meu nariz, lá para as bandas de onde eu moro, no Largo do Chafariz.
Esta é a história do cão mandrião, que passava o dia a fingir que dormia, à beira da Loja do Salsicheiro.
Ai que trapaceiro!
Com um olho dormitava. Com o outro, ele espreitava. E o Salsicheiro, volta e meia, e meia volta, tropeçava no rabo do cão e este gania, gania até fazer doer o coração. E, com feitiço nos olhos, o cão olhava o Salsicheiro como quem diz:
— Sou tão infeliz! Pisaste-me o rabo, ó seu diabo! Hás-de ir pró inferno!
E o Salsicheiro, já nisto vezeiro, dizia furioso:
— Está bem, está bem, eu cá me governo! Mas pára com isso!
E o espertalhão do cão ganhava um chouriço.
E todos os dias, isto acontecia. E o Salsicheiro não se apercebia de que o cão mandrião este truque fazia, porque já sabia do seu fraco eterno: o medo que tinha de ir para o inferno.
E assim, todos os dias, de feitiço em feitiço, o espertalhão do cão mandrião ganhava um chouriço.
«Se Deus tivesse falado…»
Há 3 dias
Um cão bem espertalhão, quase a tornar-se como muitos outros seres, para o nosso caso humanos, que exploram os medos, inseguranças e ignorâncias dos outros, para venderem gato por lebre, acessos a purgatórios por Paraísos, ou para viverem simplesmente como mandriões coitadinhos...
ResponderEliminarAlgo me surpreendeu no conto: o Largo do Calhariz, local onde trabalho de quando em quando em comentários a livros para leilão na Livraria Antiquária do Calhariz...
Foi apenas a sua imaginação ou a do cão, ou o local, por coincidência bem histórico pois já no século XVI ali funcionava a famosa tipografia dos Craesbeeck, faz parte das suas errâncias galataicas reais?
Penso que o meu amigo não leu correctamente o nome do Largo, que na minha história é Largo do Chafariz. Não do Calhariz, que aliás não conheço. Mas uma vez que falou nele, fiquei com curiosidade em conhecê-lo.
ResponderEliminarContinuo agradecida pelas suas deambulações por esta minha Galatea.
Mea culpa...
ResponderEliminarQuando vier a Lisboa, previna-me que lhe servirei de guia nessa zona histórica que do Bairro Alto desce aos socalcos até às margens do aurífero Tejo... hoje infelizmente cada vez mais tapadas e desfiguradas pelos interesses das classes que se governam da coisa publica...
Mesmo assim, talvez, com graça afortunada ou galataicamente, possamos sentir os Zéfiros ou as Tágides que o Luís de Camões decerto viu no seu olho único...
Sim, fiquei interessada em conhecer o Largo do Calhariz.Um dia, quando for a Lisboa...
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